Sob sigilo, Dom Pedro I e suas duas mulheres são exumados pela primeira vez

Restos mortais de Dom Pedro I, o primeiro imperador brasileiro, e de duas imperatrizes foram exumados para estudos; corpos estavam no Parque da Independência, na zona sul da capital, desde 1972.

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Agora se sabe que o imperador tinha quatro costelas fraturadas do lado esquerdo, o que praticamente inutilizou um de seus pulmões – fato que pode ter agravado a tuberculose que o matou, aos 36 anos, em 1834. Os ferimentos constatados foram resultado de dois acidentes a cavalo (queda e quebra de carruagem), ambos no Rio, em 1823 e em 1829.

Ao realizar o inventário do caixão de Dom Pedro, nova surpresa: não havia nenhuma comenda ou insígnia brasileira entre as cinco medalhas encontradas em seu esqueleto. O primeiro imperador do Brasil foi enterrado como general português, vestido com botas de cavalaria, medalha que reproduzia a constituição de Portugal e galões com formato da coroa do país ibérico. A única referência ao período em que governou o Brasil está na tampa de chumbo de um de seus caixões (ele estava dentro de três urnas), na qual foi gravado “Primeiro Imperador do Brasil” ao lado de “Rei de Portugal e Algarves”.

Ao longo de três madrugadas, os restos mortais da família imperial brasileira foram transportados da cripta imperial, no Parque da Independência, à Faculdade de Medicina da USP, na Avenida Doutor Arnaldo, em Cerqueira César, onde passaram por sessões de até cinco horas de tomografias e ressonância magnética. Pela primeira vez, o maior complexo hospitalar do País foi utilizado para pesquisas em personagens históricos – na prática, Dom Pedro I, Dona Leopoldina e Dona Amélia foram transformados em ilustres “pacientes”, com fichas cadastrais, equipe médica própria e direito a bateria de exames.

No caso da segunda mulher de Dom Pedro I, Dona Amélia de Leuchtenberg, a descoberta mais surpreendente veio antes ainda de que fosse levada ao hospital: ao abrir o caixão, a arqueóloga descobriu que a imperatriz está mumificada, fato que até hoje era desconhecido em sua biografia. O corpo da imperatriz, embora enegrecido, está preservado, inclusive cabelos, unhas e cílios. Entre as mãos de pele intacta, ela segura um crucifixo de madeira e metal.

O estudo também desmente a versão histórica – já próxima da categoria de “lenda” – de que a primeira mulher, Dona Leopoldina, teria caído ou sido derrubada por Dom Pedro de uma escada no palácio da Quinta da Boa Vista, então residência da família real. Segundo a versão, propalada por historiadores como Paulo Setúbal, ela teria fraturado o fêmur. Nas análises no Instituto de Radiologia da USP, porém, não foi constatada nenhuma fratura nos ossos da imperatriz.

“Unimos as ciências humanas, exatas e biomédicas com o objetivo de enriquecer a História do Brasil. A cripta imperial foi transformada em laboratório de especialidades, com profissionais usando os equipamentos mais modernos em prol da pesquisa histórica”, disse a pesquisadora, que defendeu hoje pela manhã sua dissertação de Mestrado na USP, após três anos trabalhando sob sigilo acadêmico. “O material coletado será útil para que as pesquisas continuem em diversas áreas ao longo dos próximos anos.”

A reportagem do Estado acompanha os estudos de Valdirene desde 2010, quando a historiadora e arqueóloga conseguiu autorização dos descendentes da família imperial para exumar os restos mortais dos personagens históricos. Veja neste especial todos os detalhes de um estudo que reescreve detalhes da história do Brasil – confirmando algumas informações, desmentindo outras e adicionando novas verdades.

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